sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Síndrome de Burnout


A dinâmica do mundo moderno favoreceu o aparecimento de muitas doenças e transtornos mentais, em especial no ambiente de trabalho. Para além da selva em que o mercado de trabalho se transformou e o esforço que cada um de nós tem que fazer para manter o seu emprego, a própria sociedade consumista que privilegia os cargos ou postos ocupados, acaba por avaliar os indivíduos pelas profissões que cada um possui.

O Síndrome de Burnout é um fenómeno psicossocial directamente relacionado com o mundo laboral e refere-se a uma reacção ao estado de exaustão e diminuição de interesse relativo ao trabalho, em que, o que a este diz respeito deixa de ter importância e qualquer esforço pessoal parece ser inútil. Trata-se de uma fadiga extrema que resulta de uma tensão emocional crónica associado a um período de esforço excessivo com intervalos demasiadamente curtos para recuperação. Burnout é um termo inglês: burn=queima e out=exterior, sugerindo assim que a pessoa com esse tipo de stresse consome-se física e emocionalmente, passando a apresentar um comportamento agressivo e irritadiço. Alguns dos factores agregados ao Síndrome de Burnout podem ser dificuldades de relacionamento com chefes, colegas ou clientes, conflitos entre trabalho e família, pouca autonomia no desempenho profissional, sentimento de desqualificação ou de falta de cooperação em equipa. Esta síndrome é uma das consequências mais marcantes do stresse profissional e caracteriza-se não só por exaustão emocional, mas também por avaliação negativa de si mesmo, depressão e uma despersonalização que leva à insensibilidade com relação ao que o rodeia. Estes sintomas emocionais podem transformar-se em problemas físicos como fadiga crónica, dores de cabeça, insónias, úlceras gástricas, hipertensão arterial, taquicardia, arritmia, perda de peso, dores musculares e de coluna, alergias e lapsos de memória. E também em alterações dos hábitos: maior consumo de café, álcool e medicamentos, faltas no trabalho, impaciência, sentimentos de impotência, incapacidade de concentração e baixa tolerância à frustração. Em extremo podem ter comportamentos paranóicos tais como agressividade ou tentativas de suicidio. As pessoas que na sua vida têm profissões predominantemente relacionadas a um contacto interpessoal mais exigente, com frequentes e intensas interacções, emocionalmente densas, tais como médicos; enfermeiros; assistentes sociais; funcionários públicos, polícias ou bombeiros e todos os profissionais que interagem de forma activa com pessoas, que cuidam ou solucionam problemas das mesmas e de quem se espera uma atitude, no mínimo solidária, têm uma maior propensão a serem atingidas por este problema. Não há nada mais desgastante e consumidor de energia humana do que os conflitos, tanto internos como externos. Apesar disso, a solução não pode passar pelo isolamento e a evitação do contacto com os outros para prevenir conflitos, porque tal atitude pode causar o sentimento de solidão. As pessoas padecentes de Burnout são os chamados: excelentes funcionários. São pessoas extremamente dedicadas às instituições que representam, que fazem imensas horas extra para respeitar prazos, são pessoas altamente motivadas e exigentes consigo e com os outros, perfeccionistas e rígidas. No entanto estar envolvido em relacionamentos, tarefas e ambientes carregados de stresse por uma quantidade de tempo superior ao que cada um pode suportar ou consegue lidar pode transformar a pessoa em uma espécie de autómato. As características de humanização e ajuda vão decrescendo, revelando-se em demonstrações grosseiras e negativas para com as pessoas com quem lida no local de trabalho podendo estender-se ao contexto particular. O que acontece é que para não entrar em colapso a pessoa passa a agir automaticamente sem qualquer envolvimento emocional, o que resulta desastroso na produtividade e no clima organizacional. É importante perceber que Síndrome de Burnout não é o mesmo que depressão ou simples stresse. Enquanto nos depressivos percebe-se uma maior apatia e sentimentos de culpa e perda, quem sofre de Síndrome de Burnout caracteriza-se sobretudo por desapontamento, cansaço e tristeza, perfeitamente identificado e associados ao trabalho.

Como forma de contornar este problema há que, antes de mais, admitir que algo não está bem consigo mesmo, sobretudo se identifica vários dos sintomas aqui descritos e perceber que o problema ainda que tenha partido de outro/s passou a fazer parte de si. Assim deixam-se algumas sugestões de estratégias para lidar com o stresse: a) Realizar actividades de relaxamento; b) Organizar o tempo e decidir quais são as prioridades; c) Manter uma dieta equilibrada e fazer exercício físico; d) Discutir os problemas com os colegas de profissão; e) Promover acções de formação sobre gestão de conflitos.

Em casos extremos, aconselha-se a ajuda profissional.
 Sílvia Silva – Psicóloga Clínica

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Jovens violentos


A violência na adolescência é cada vez mais comum, tornando por isso também cada vez mais comuns as noticias quase diárias de crianças e adolescentes que sofrem ou sofreram bullying. A partir daí muito se tem dito, estudado e feito para perceber o bullying e as suas vítimas. O perfil das vítimas, os traumas que ficam, como lidar com as consequências dos que sofrem às mãos de adolescentes agressivos que para se exibirem ou se armarem em fortes transformam a vida de alguém sem se darem conta de tal.

Então e os agressores? Os tais jovens violentos que gozam, criticam, humilham, batem e magoam os outros… será que são menos vítimas?

Cientificamente consegue-se perceber que a agressividade está directamente ligada à imaturidade. Tanto à imaturidade física, no que diz respeito às estruturas do cérebro, como à imaturidade psicológica, no que diz respeito aos comportamentos e atitudes.

Dito de outro modo, sabemos que uma criança ou jovem que não foi exposto a desafios ou frustrações suficientes, não desenvolve estratégias de resolução de problemas. A super proteção familiar, a permissividade e a rápida cedência às exigências dos mais novos, fá-los acreditar que a vida é muito mais fácil do que os adultos querem fazê-los acreditar. Jovens que não sejam contrariados, que não pensem pela sua própria cabeça ou que não tenham consequências dos seus actos irreflectidos consideram que não têm que se esforçar, porque da maneira como agem a vida corre-lhes bem.

Este contexto contribui para a imaturidade psicológica, para a dificuldade em resolver problemas diários e até mesmo pequenos conflitos. A nível físico (da estrutura do cérebro) as células trabalham pouco e portanto não se desenvolvem. Quando a nível cerebral as estruturas são imaturas, perante uma adversidade, será difícil responder de forma madura e ponderada.

A nível social encontram-se ainda outras respostas para a agressividade nos jovens. A necessidade de se integrarem num grupo, de serem reconhecidos pelos seus pares e de eles próprios não serem uma vez mais excluídos (quando em grande parte dos casos o são no seu seio familiar) pode explicar este tipo de atitudes.

Se considerarmos que os jovens nos dias de hoje são mais imaturos a todos os níveis, porque os pais têm cada vez menos autoridade, estão cada vez mais frágeis, com maior dificuldade em contrariar, em dizer não e em exigir-lhes o cumprimento de tarefas simples, é natural que estes mesmos jovens tenham mais tendência para serem agressivos.

Para que essa agressividade seja clínicamente diagnosticada como uma patologia é necessário que o jovem responda a determinadas características ou critérios que serão avaliados pelo profissional (psicólogo clínico) em contexto terapêutico.

É no entanto muito importante compreender o histórico de vida desse jovem, perceber o seu contexto familiar e social para poder ir ao seu encontro.

Isto não invalida de modo algum que o jovem seja responsabilizado pelos seus actos, mas mais que o considerar como um caso perdido há que o ouvir e entender que quando um jovem agride, mais do que fazê-lo por maldade fá-lo na maioria das vezes porque sofre, porque não tem apoio, não tem mimo, não tem orientação e precisa de deitar cá para fora essa mágoa.

 

Sílvia Silva - Psicologa Clinica

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Fotografia




A memória é talvez das áreas do cérebro que mais determinam a personalidade. Aparentemente não terão tanta importância como a coordenação de movimentos ou a área de raciocínio matemático no entanto é a memória que nos permite armazenar conhecimento e evita que se repitam todas as aprendizagens. A cada dado novo, cada informação, contará como um acrescento à base já existente no cérebro e em conjunto com o já aprendido terá uma outra recepção e um outro entendimento. O cérebro funciona como as gavetas da cómoda lá de casa, as gavetas que menos utilizamos acabamos por esquece-las. Assim vejamos, quando guardamos roupas de inverno e passamos todo o verão sem as usar, quando começa novamente a fazer frio e vamos procurar o que guardamos hà tanto tempo, às vezes temos verdadeiras surpresas, como se nunca tivéssemos tido aqueles artigos, porque simplesmente nem nos lembramos. No entanto as peças que mais utilizamos, relógio de pulso por exemplo, parecem quase fazer parte de nós, nunca nos esquecemos e não passamos sem elas. São as situações mais vivas no nosso cérebro que determinam de algum modo a nossa personalidade.

As fotografias que tendemos a tirar sobretudo na infância recente dos nossos filhos, são ferramentas essenciais na construção do carácter dos mesmos. As lembranças gravadas nas fotografias contam histórias, a história de uma criança que à medida que cresce vai preenchendo as lacunas da memória com provas físicas (fotografias) da sua existência. A capacidade de memorização no ser humano dá-se desde a nascença, no entanto as primeiras memórias são tão ténues que só passam a efectivas quando constantemente estimuladas, seja com discursos relacionados ou com fotografias comprovativas daqueles momentos.

A imagem projectada numa fotografia diz muito do indivíduo. Não tendo palavras, a linguagem corporal ajuda-nos a identificar á posteriori que tipo de emoções e sentimentos estaríamos a experimentar no momento do clic. Ajuda-nos por isso a conhecermo-nos melhor a perceber o nosso percurso, a definir a nossa história. As fotografias são então importantes ao ponto de contribuir para a auto-estima, rever-se tem até o poder de alterar sentimentos, isso acontece quando estamos muito tristes e revemos fotografias de momentos muito alegres e simpáticos.

Quando vemos um álbum e não constam fotografias de uma determinada altura da vida, parece que temos um sentimento de vazio. O comprovativo do nosso percurso é sem dúvida fundamental para nos sentirmos mais confiantes e seguros, não só do que somos, mas do que vivemos e ajudou a definir a pessoa em que nos tornamos.

 
Sílvia Silva - Psicologa Clinica

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Filhos do divórcio


A tradição já não é o que era e as alterações que a sociedade vai sofrendo revelam-se também na constituição das famílias. As crianças filhas de pais separados deixaram de ser apontadas, tudo porque deixaram de ser “raras”. Hoje as famílias mono parentais representam uma faixa importante da população e uma em cada quatro crianças é filha de pais separados. Um número que podemos considerar fictício pois não contempla nenhuma união não civil. A questão é: quais as repercussões de tais mudanças? Por um lado estas metamorfoses vêm criar a necessidade de compensação parental, o que favorece um crescimento infantil num registo perfeitamente omnipotente. Situações de divórcio provocam nos pais sentimentos de culpa que despoletam a compensação material. Ou seja, perante uma evidente falha cometida pelos progenitores, no que se refere ao desmembramento da família, os pais tentam consertar esse “erro” com outro. A criança percebe e manipula de modo a atingir os seus mais breves caprichos. Sabe-se que a falta de coerência (inconstância de critérios); a falta de consistência (força infantil sobre a fraqueza parental, ainda que agora digam “não” perante a insistência da criança acabam por dizer “sim”) e a falta de continuidade parentais (ausência de postura educativa, que passa por períodos de firmeza intercalados com outros de permissividade) são propriedades fundamentais ao registo de patologia infantil. Com a desculpa de “para que não fiquem traumatizados” é-lhes cedido, permitido e oferecido tudo. A demissão dos pais enquanto educadores, optando pelo facilitismo, o que de alguma forma lhes diminui a culpa, pode repercutir-se num egocentrismo infantil, que gera uma espécie de pequenos ditadores sem regras, que não têm noção dos limites, a que os pais dizem não ter mão. Por outro lado a dificuldade dos adultos em aceitar um processo de separação pode fazer com que a criança passe a ser um joguete no meio da guerra que se cria. Provavelmente o mais doloroso para os filhos de um divórcio será terem de desistir de um dos pais dentro do seu coração e abdicar de uma parte de si mesmos. Nas lutas entre ex-conjuges é frequente a utilização e manipulação da criança para magoar o outro. Trata-se de Síndrome de Alienação Parental (S.A.P.) e é um transtorno pelo qual um progenitor transforma a consciência do seu filho, mediante vários ardis, com objectivo de impedir, ocultar e destruir os vínculos existentes com o outro progenitor, levando-o a ter apenas sentimentos negativos para com ele. Surge principalmente no contexto da disputa da guarda e custódia das crianças, e o seu promotor ou agente, o progenitor alienador, na maior parte dos casos, é o que tem a seu cargo a custódia legal dos filhos. Os estratagemas consistem em tentativas de minimizar o contacto com o outro, impedindo o contacto telefónico ou físico, na expectativa que a criança se desiluda, fique magoada e pense que o progenitor alienado não se preocupa com ela. Estas lavagens cerebrais pautadas por campanhas anti-ex-conjuge fomentam o desprezo e ódio da criança por um dos pais e pelo outro lado o medo de perda e dependência psicológica. Este tipo de posturas educativas: quer a compensação parental quer o S.A.P., provocam inúmeros transtornos e sequelas nas crianças. É importante reflectir e perceber que a vinda de um filho tem que ser associada a um projecto parental educativo e que este novo ser, é alguém muito importante e independente dos pais, que por eles deve ser encaminhado e amado e nunca utilizado em benefício próprio. Como diria Pedro Strecht um dos papéis mais importantes dos pais é o de ajudarem os filhos a crescer, mas para isso é preciso saber ser crescido.
Sílvia Silva - Psicologa Clínica