segunda-feira, 26 de abril de 2021

Como explicar as doenças às crianças



 É através da comunicação que definimos a qualidade das nossas relações

Comunicar é pôr em comum, é passar para o outro o que pensamos e sentimos. É dar-nos a conhecer, de maneira a que o outro se possa relacionar connosco.

A forma como comunicamos com alguém depende do grau de relação/intimidade que temos, mas também deverá depender do momento de vida que nós e o outro estamos a passar e sobretudo da capacidade de entendimento do outro.
Temas complexos como a doença, as limitações físicas e a morte, têm um grande impacto emocional tanto no emissor como no receptor. Estamos a falar de uma situação que por si só nos abala e fragiliza e portanto, provavelmente nos condicionará na forma de nos relacionarmos e comunicarmos, e que, por se tratar de momentos de vulnerabilidade aumentada, a sensibilidade para receber ou dar mensagens negativas é maior. Se a isto juntarmos o factor criança, ter que comunicar a uma criança que um familiar ou alguém próximo está doente, acresce em muito o grau de dificuldade.
Habitualmente as famílias nestas ocasiões tentam poupar as crianças ao máximo de informação, omitindo ou mentindo, tentando assim evitar o sofrimento. No entanto, as incoerências de discurso e silêncios incómodos decorrentes de uma situação de crise em que um familiar, amigo ou alguém muito próximo se encontre doente, tenderão a destabilizar a criança e a afligi-la por perceber que algo se passa mas sem saber do que se trata. Estas dificuldades dos adultos têm não só a ver com a necessidade de proteger a criança, mas também de se auto-proteger evitando confrontar-se com questões desconfortáveis, e a ter que lidar com a reação da criança, mas também por recearem a sua própria reação à forma como a criança se possa manifestar.
Então como explicar as doenças às crianças?
A família é a base estruturante para qualquer criança. Assim, deve ser o elemento da família mais próximo e em quem a criança mais confia a dar a notícia. Com exceção se essa pessoa não estiver bem para o fazer, não tenha ela própria ainda digerido a informação e eventualmente se encontre em choque ou transtornada. As explicações devem adequar-se à faixa etária e ao nível de desenvolvimento/compreensão da criança.
Antes de darmos a informação, importa conversar com a criança de maneira a nos inteirarmos do que já sabe e pensa sobre as doenças e como lida com a ideia. Como foi dito, há a ter em conta o tipo de estrutura familiar, o desenvolvimento cognitivo e emocional da criança, a faixa etária, a sua personalidade e sensibilidade e a sua experiência de vida. Isto irá influir na forma como gere a notícia sendo que tendencialmente, quanto mais nova é a criança, menos capacidade tem de elaborar, pela sua pouca experiencia de vida, o que resultará em manifestações mais físicas, somáticas. Crianças mais velhas ou adolescentes tenderão a reagir comportamentalmente. As crianças mais novas precisam de informação simples e clara, enquanto os adolescentes necessitam de ter informação mais detalhada. Dizer que temos uma má noticia para lhe dar, por si só ajuda-a a preparar e amortizar o que vem a seguir. É importante ir explicando devagar e calmamente, avaliando através da sua reação até onde podemos ir, sem dar informação excessiva que esta não consiga perceber ou digerir, e sem floreados para não confundir a criança.
A criança vai percebendo pela dinâmica familiar, alteração do estado emocional dos que a rodeiam e/ou até ausência física do familiar/amigo doente (para tratamentos ou internamento) que houve uma alteração da realidade percebida até então. Ser informada, não elimina a tristeza da criança, mas sim, permite-lhe dar um significado aos acontecimentos, interioriza-los e elaborá-los. Ser informada permite também que se sinta confiante para questionar e ser esclarecida do que a angustiar. Ainda que as crianças reajam de formas diferentes, existem reações mais comuns ao sofrimento tais como: dificuldades de aprendizagem; dificuldades de concentração; comportamentos regressivos; alterações do sono; perturbações de comportamento de oposição ou desafiante (birras) ou somatização.
É por isso importante permitir que a criança se exprima, e ajudá-la a lidar com os sentimentos e as emoções, bem como a gerir o processo de perda da pessoa doente, como ela era, e ajustar-se à nova realidade que poderá até desencadear na morte da mesma.
Por Sílvia Silva - Psicóloga Clínica