Não é raro olharmos para trás e não nos reconhecermos em decisões
que outrora tomámos. Por vezes questionamo-nos até: como é que não vi que não
era boa ideia ir por ali?!?
Mas o certo é que fomos. O certo é que naquele momento, perante
aquela imperatividade de optar, foi de uma forma, que aos olhos de hoje achamos
imatura ou despropositada, que escolhemos.
Isto porque, ao contrário do que dizem, as pessoas mudam. Não existe
ser humano que fique estático com o passar do tempo e que nada altere
cognitivamente, na sua percepção das e sobre as coisas.
O tempo traz vivências, boas e más, que vamos interiorizando e
misturando com as outras vivências que já tinhamos tido e, gerimos, melhor ou
pior o que nos vai acontecendo. E mesmo quando achamos que tudo está
ultrapassado e que conseguimos lidar bem com uma situação, o certo é que,
aquilo que acontece a seguir pode mudar inclusivamente o que já estava
arrumado.
Podemos dizer “grosso modo” que todos nós temos um lado racional e
outro emocional. Podemos também dizer que a dificuldade dos seres humanos
sempre foi encontrar o balanço certo entre estas duas vertentes, para que de
forma assertiva (racional) e bela (emocional) possamos caminhar de forma
equilibrada ao longo da vida.
Não podemos então escamotear algo tão importante como a maturidade e
ou a consciência (ou níveis de consciência). Quer isto dizer que: à medida que
vamos tendo experiências de vida, o nosso organismo, liderado pelo nosso
cérebro, vai armazenando e arrumando as novas informações, sentimentos e
emoções inerentes a essa experiência. É como se, dependendo do que aquele
acontecimento desperte em cada um de nós, a pessoa que o vive acorde um aspecto
do seu cérebro que é o responsável por lidar com aquela emoção, seja ela raiva,
alegria ou desilusão. Digamos que activa uma ferramenta, que fica a partir
daquele momento activada, fica disponivel para ser usada de maneira mais
imediata numa próxima necessidade, numa próxima situação que volte a despertar
aquela área do cérebro ou aquela emoção.
Assim, genericamente podemos dizer, que quantas mais ferramentas
mentais forem activadas no nosso cérebro, melhor preparados ficamos para lidar
com as adversidades e surpresas da vida.
Voltando atrás e reforçando, se sabemos que as nossas ferramentas
mentais só são (na sua maioria) activadas através das experiências que as
provocam, podemos concluir que quantas mais experiencias vivemos, mais bem
preparados estamos para lidar com as seguintes.
Aqui começa o processo da maturidade: experienciar, despertar emoções, geri-las e aperfeiçoa-las.
Aqui começa o processo da maturidade: experienciar, despertar emoções, geri-las e aperfeiçoa-las.
No entanto há quem tenha ao longo da vida percursos que se repetem e
aos quais chamamos de comportamentos padrão. Então quando alguém vive um episódio
que lhe desperta uma emoção, aprende a lidar com essa situação, pode inda assim
repetir decisões que já sabiam ser erradas? Sim!!
Primeiro porque não basta viver a vida e andar para a frente,
achando que ultrapassou tudo, quando grande parte das vezes não ultrapassou
nada. Apenas guardou atrás da porta, ou debaixo do tapete como habitualmente se
diz e em qualquer um desses casos, à primeira oportunidade, ou seja, à primeira
vivência semelhante, não só não a sabe gerir porque não aprendeu a fazê-lo na realidade
e apenas ignorou pondo para baixo do tapete, como vai trazer tudo ao de cima,
quer isto dizer, vai juntar a situação actual com a anterior e torna a dor ou
dificuldade em viver saudavelmente aquele acontecimento, quase impossível de
acontecer.
Segundo porque mesmo que tenha aprendido muito com aquele
acontecimento que lhe provocou uma emoção dolorosa, as pessoas muitas vezes
preparam-se, não para acontecimentos semelhantes, não na reflexão da sua emoção
e do que causou aquela dor, mas sim tentam identificar sinais externos, tentam
identificar contextos semelhantes de modo a se anteciparem. Daí resultam dois
erros, o primeiro é não se terem focado em si mesmas e na análise das suas
emoções e depois porque se arriscam a afastar e sabotar todas as situações que
tenham um contexto semelhante. Se falarmos de uma relação amorosa por exemplo,
da qual uma das pessoas saiu magoada, esta pessoa tem ou deve centrar a sua
reflexão na sua dor e no porquê da sua dor para aprender a trabalhar em si o
que a magoa e a estar melhor preparada. O que muitas vezes acontece é, ao invés
disso, a pessoa se focar em evitar o contexto, ou seja, evitar uma nova relação
amorosa.
Falou-se ainda em níveis de consciência. Estes vem arrolados com a
maturidade, são como aquelas lentes que nos vão pondo nos óculos-teste dos
oftalmologistas em que a cada lente, por norma, vemos melhor e mais nítido.
Assim são os níveis de consciência. À medida que o tempo passa vamos vendo mais
nítido, e essa nitidez permite-nos ver pormenores que antes não conseguíamos
ver. E é por isso que aquilo que agora achamos obvio, na altura em que o
fizemos também era, só que era à luz de outros olhos, de outra maturidade, de
muito menos experiência e de uma muito menor clareza sobre, quer o aspecto
geral, quer sobre os detalhes de cada situação.
É imprescindível que tenhamos esta noção. A noção de que não somos
as mesmas pessoas que éramos ontem e que, amanhã já alguma coisa mudou em nós.
E que por isso, temos o dever de nos perdoarmos, relativamente às más decisões
que no passado tomámos e que nos pareciam as melhores. Tal como é
imprescindível percebermos que a maturidade se adquire não só porque o tempo
passa, mas sim pelo que fazemos com esse tempo e pelo que fazemos com o que nos
acontece.
Sílvia Silva - Psicóloga Clínica